Quando a limitação se transforma em motivação
Desde o último domingo (23), Itupeva realiza a Semana da Pessoa Com Deficiência, assunto que muitas vezes leva as pessoas a pensarem em limitação. Outras, no entanto, preferem dar sentidos diferentes e encaram os obstáculos de forma exemplar.
“Eu tenho o desejo de sempre fazer o melhor e aumentar a cada dia a certeza de que eu sou capaz de alcançar todos os meus objetivos, se bem planejado e me dedicando”. A declaração poderia ser dada por qualquer um que acredita no seu potencial, mas ganha maior força quando vem de Ricardo Novais Santos Claros, atleta que coleciona medalhas e, no último ano, teve o privilégio de estrear em uma prova internacional.
“Eu tenho deficiência visual, possuo alta miopia, catarata, nistagmo, visão subnormal adquirida devido à falta de oxigênio que tive na hora de nascer. Além disso, também tenho um problema na retina, que está gasta”, conta o atleta que, desde 2014, participa do PEPT (Projeto Esporte Para Todos) de Itupeva e compete em provas de atletismo (corrida e salto em distância), já tendo conquistado dezenas de medalhas, grande parte de ouro.
O caminho até as conquistas esportivas não foi fácil. Assim como as dificuldades que a maioria dos deficientes enfrenta por diversos motivos, esse itupevense nascido na Praia Grande há 26 anos também teve sua parcela de obstáculos.
“Tive dificuldades normais, como todo deficiente nesse país. Sempre estudei em escola de ensino regular e meus pais sempre cuidaram de mim”, comenta e revela: “Mas o que me incomoda é a questão de depender dos outros para muitas coisas”.
A caminhada no esporte
O interesse para as atividades físicas surgiu em 2014, a convite da colega de trabalho Dayane Bandeira, recordista itupevense de medalhas de ouro em uma única edição de Jogos Abertos – foram três ouros naquele ano – e que também tem uma inspiradora história de superação.
Ricardo aceitou o convite, conheceu o PEPT, e logo em sua primeira participação nos Jogos Regionais, no ano seguinte, conquistou cinco medalhas (dois ouros e três bronzes), nas modalidades de atletismo e natação. “Eu achava que conseguiria ganhar alguma medalha, mas não cinco, principalmente na natação, que eu não tinha muita confiança no meu desempenho, mas foi uma boa surpresa”, surpreendeu-se na época, revelando também que as primeiras vitórias foram combustível para as conquistas futuras.
“O Ricardo é um atleta com grande potencial. No início do treinamento ele nem sabia correr direito, eu corria do lado dele pra ensiná-lo”, relembra sua técnica, a professora Jane Bergantim, criadora do PEPT. “Mas desde o início vimos que ele era forte, e mesmo com a dificuldade no treinamento, porque o espaço é adaptado, ele consegue se sair muito bem nas competições. Isso por conta também da sua enorme força de vontade”, elogia.
“As palavras certas para descrever o Ricardinho são superação e determinação, porque apesar da falta de um local adequado para os treinamentos, ele consegue superar seus tempos e suas marcas em cada competição”, observa a professora Alessandra Gilioli, que também acompanhou o atleta em grande parte da sua caminhada esportiva.
Medalhas, conquistas e reconhecimento
Depois que começou a competir, Ricardo não parou mais. Conquistou medalhas em competições como no XIII Troféu Sérgio Del Grande, nos Jogos Paralímpicos Universitários e no Circuito de Loterias Caixa. Recentemente, ganhou três medalhas – duas delas de ouro – em sua primeira competição internacional o “FISUAMERICA Games”, primeiro Pan-Americano voltado exclusivamente para o público universitário.
“Poder competir a nível nacional me dá motivação para buscar ser melhor e alcançar algo maior”, pontua o atleta, que embarca nesta sexta-feira (28) para mais um desafio, o Campeonato Brasileiro Loterias Caixa de Atletismo, com 522 atletas de 23 estados brasileiros, além do Distrito Federal.
Realizado no CT Paralímpico Brasileiro, em São Paulo, essa terceira e última etapa é o mais importante evento paralímpico nacional de atletismo e conta com a presença de medalhistas paralímpicos como o paraibano Petrúcio Ferreira, ouro nos Jogos Rio 2016; o alagoano Yohansson do Nascimento, campeão paralímpico em Londres 2012; e o paraense Alan Fonteles, também campeão em 2012.
“Duvidar de nós mesmo é algo que sempre passa pela cabeça de toda e qualquer pessoa que se entende por gente, pois quando você traça um objetivo a longo prazo, tem aquele momento que você duvida que irá conseguir. Mas através do esporte, se ganha um ‘up’ motivacional de perseguir, pois você consegue acompanhar sua própria evolução através dos resultados e quanto mais positivo forem, mais você quer ir longe”, conclui o atleta que, embora saiba já ter ido até onde poucos têm o privilégio de chegar, também tem consciência de que sua dedicação pode levá-lo muito além. Para sua dedicação e força de vontade, o céu é o limite.